CELEBRAR O DOMINGO VIGÉSIMO SEGUNDO
As leituras do vigésimo segundo domingo (Ano B) interpelam-nos sobre uma questão central para a nossa vida cristã: diz respeito à «lei», aos mandamentos, e à sinceridade da nossa relação com Deus. De que valem os mandamentos, se não os pomos em prática? É, por outras palavras, o que Moisés recorda ao povo de Israel (primeira leitura). Tiago, na sua carta, também exorta: «sede cumpridores da palavra e não apenas ouvintes» (segunda leitura). O mesmo é afirmar a importância da prática, entre outras, das obras de misericórdia, pois «quem assim proceder jamais será abalado» (salmo). E o que opõe os fariseus a Jesus Cristo (evangelho) é da mesma ordem: a atitude exterior não basta; Deus olha a bondade do coração, a autenticidade do compromisso.
«Guardareis os mandamentos do Senhor vosso Deus»
O livro do Deuteronómio («segunda lei») dá a conhecer os discursos de despedida feitos por Moisés ao povo de Israel, às portas da Terra Prometida. Neste fragmento, faz um sumário da história e das leis do povo de Deus.
O Deuteronómio é o grande prólogo teológico dos livros históricos («história deuteronomista») que se seguem no cânon bíblico (de Josué até aos Reis). A ideia é clara: Israel, agora, receberá a terra que tinha sido prometida a Abraão e aos seus descendentes. Esta terra é um dom gratuito, embora haja condições a cumprir para nela permanecer. Uma das condições é cumprir os mandamentos. Estes não se podem alterar. Para todas as gerações vindouras, a cláusula para permanecer naquela terra consiste em observar «as leis e os preceitos» enumerados por Moisés.
Os mandamentos postos em prática serão uma realidade evidente aos olhos de todos os outros povos, uma vez que, através deles, reconhecerão uma sociedade «diferente»: um povo «sábio» e «prudente». Os mandamentos são uma ética sábia e eficaz.
Outro aspeto presente no texto reporta-se à proximidade de Deus. Os deuses pagãos vivem afastados e alheios aos acontecimentos da humanidade, o que não se verifica com o Deus de Israel. Consciente desta proximidade divina, o povo deve sentir-se satisfeito pelas leis e preceitos e não desejar alterações: «Não acrescentareis nada ao que vos ordeno, nem suprimireis coisa alguma». Assim se entende esta petição, que não pode ser lida como imobilismo, mas como sinal da ordem justa desses mandamentos que servem para orientar a vida do povo de Deus.
As recomendações de Moisés dão a conhecer uma proposta de vida que é garantia de sentido no presente e estabilidade no futuro. Todavia, Jesus Cristo, no seu tempo, deteta e denuncia os desvios marcados pelo «ritualismo» e pela moral farisaica, bem contrários ao mandamento do amor. Hoje, certamente que encaixam nestes desvios as orações e os rituais sem convicção, a prática do «preceito» dominical sem compromisso vital, as oferendas e as promessas feitas para obter este ou aquele benefício, tudo o que está à margem do mandamento do amor a Deus e ao próximo. Deus aprecia o «interior», o que habita o coração humano, e não as aparências.