Gaudium et Spes — Constituição Pastoral sobre a Igreja no mundo atual [12]
Terminamos o resumo da Constituição Pastoral do II Concílio do Vaticano sobre a Igreja no mundo atual («Gaudium et Spes» [GS]). Neste último tema seguimos o texto publicado na obra de Darlei Zanon, «Para ler o Concílio Vaticano II», ed. Paulus. No início, o Concílio não tinha previsto uma comissão para o estudo dos problemas sociais e da relação da Igreja com o mundo. Esta comissão foi criada a partir do pedido do cardeal Suenes, da Bélgica. Dos estudos desta comissão surgiu um texto inicial que foi reelaborado e ampliado diversas vezes até ser promulgado a 7 de dezembro de 1965. A «Gaudium et Spes» (em português, «Alegrias e Esperanças») foi o último documento aprovado: 2309 votos a favor, 75 contra e 10 nulos. Comparado com outros documentos, o número de votos contra é alto, o que é compreensível devido ao facto de abordar temas delicados para a Igreja daquela época.
Base da Doutrina Social da Igreja
A quarta das constituições do Concílio trata fundamentalmente das relações entre a Igreja Católica e o mundo. A GS é apresentada como «Constituição Pastoral», pois apresenta na primeira parte a compreensão do ser humano e da sociedade em chave teológica (parte doutrinária) e na segunda trata de alguns problemas concretos (parte pastoral). O seu texto é profundo e completo, constituindo a base de toda a Doutrina Social da Igreja. Mais tarde (26 de março de 1967), Paulo VI escreveu a Encíclica sobre o desenvolvimento dos povos («Populorum Progressio») para reforçar a linha de pensamento assumida pela Igreja nesta área, ou seja, alertar para o descompasso crescente entre o crescimento económico e o desenvolvimento integral, para o contraste entre o progresso tecnológico e a capacidade produtiva, de um lado, e o subdesenvolvimento de tantos povos, de outro.
Estrutura e conteúdo
A maior riqueza da GS é apresentar um olhar profético, eclesiológico e pastoral sobre a sociedade, sempre em busca da promoção da justiça e da paz. Ela visa «iluminar o mistério do ser humano e cooperar na solução das principais questões do nosso tempo» (GS 10). A sua primeira frase traduz o espírito do próprio Concílio como um todo: «As alegrias e as esperanças, as tristezas e as angústias dos homens e mulheres de hoje, sobretudo dos pobres e de todos aqueles que sofrem, são também as alegrias e as esperanças, as tristezas e as angústias dos discípulos de Cristo; e não há realidade alguma verdadeiramente humana que não encontre eco no seu coração. Porque a sua comunidade é formada por seres humanos, que, reunidos em Cristo, são guiados pelo Espírito Santo na sua peregrinação em demanda do reino do Pai, e receberam a mensagem da salvação para a comunicar a todos. Por este motivo, a Igreja sente-se real e intimamente ligada ao género humano e à sua história» (GS 1). Aí está expressa claramente a nova conceção de Igreja assumida pelo Concílio, como Povo de Deus, Corpo de Cristo e Templo do Espírito. A «Introdução» recorda a necessidade de a Igreja conhecer o mundo e acompanhar as suas transformações técnicas e sociais. Na primeira parte, o documento trata da doutrina da Igreja acerca do ser humano e do mundo. Aborda temas como a dignidade humana (números 12 a 22), a condição humana (23 a 32), a atividade do ser humano no mundo (33 a 39) e o papel da Igreja no mundo (40 a 45). Na segunda parte, estabelece linhas pastorais, respondendo à missão da Igreja no mundo. Considera vários aspetos da vida humana e da sociedade, respondendo a problemas de maior urgência para a época: matrimónio e família (47 a 52), progresso cultural (53 a 62), vida económica e social (63 a 72), comunidade política (73 a 76), promoção da paz e da Comunidade Internacional (77 a 90). Esta parte, inicialmente foi designada como «anexos», mas devido à sua importância e aos debates gerados foi incluída no corpo do documento. Ao analisarmos com cuidado a situação da sociedade atual, em clima de crise económica e principalmente de crise de valores, constatamos que os problemas não são muito diferentes, assumindo apenas uma nova face, mais moderna. Por ser o último documento aprovado, a GS bebeu de toda a nova mentalidade conciliar. Ela põe em prática todas as novidades do Concílio, especialmente o que diz respeito a uma Igreja mais aberta, comprometida e missionária. Tem especial ligação com a Constituição «Lumen Gentium», sobre a Igreja e com o Decreto «Ad Gentes», sobre a atividade missionária da Igreja: «A Igreja é por natureza missionária». O conteúdo apresentado na GS é de uma profundidade e beleza impressionantes e merece ser conhecido e retomado com frequência por todos os cristãos.
© Laboratório da fé, 2015