UMA GRANDE LUZ


A luz artificial gera demasiadas sombras e nevoeiros. Sombras de ausências, nevoeiros de tristeza, sombras de enfermidade, nevoeiros de famílias desfeitas, sombras de desemprego, nevoeiros de objetivos não atingidos… cada um conhece e sofre as suas sombras e os seus nevoeiros. Parece uma contradição: quando as festas natalícias convidam a «estar bem» surgem com mais intensidade as sombras e nevoeiros. Luzes acesas por todo o lado, adornos, compra de presentes, sorteios, cabazes, consumo, ceias e mais ceias… todo um ritual pagão que disfarça a realidade e embeleza-a com alguns rasgos de religiosidade. Porventura, dir-se-á que é demasiado artificial para ser autêntico!

Natal: uma grande luz!

«Uma grande luz!». Através de um hino litúrgico, Isaías dá-nos uma indicação: o ADN do Invisível é a luz. Esta claridade deslumbrante é como as lâmpadas dos faróis que guiam os barcos. É essa mesma claridade que encontramos na «luz da fé». Esta é «a expressão com que a tradição da Igreja designou o grande dom trazido por Jesus. […] Urge recuperar o carácter de luz que é próprio da fé, pois, quando a sua chama se apaga, todas as outras luzes acabam também por perder o seu vigor» (Francisco, Carta Encíclica sobre a fé — «A luz da fé» [«Lumen Fidei»], 1.4).
A verdade é que a celebração do tempo de Natal tem a ver com as sombras e os nevoeiros em que Deus nasce: num presépio, pobre e recusado, colocado numa manjedoura, Deus apresenta-se como luz na escuridão, como esperança no meio da confusão, como promessa na deceção. No meio da noite brilha a luz! Uma grande luz! Não é uma luz artificial. É autêntica. É nova. Nunca mais se apaga. Ilumina tudo e todos. O Natal é a celebração de um Deus que vem para iluminar a nossa vida.
Nós, aqueles que queremos seguir Jesus Cristo e o confessamos como Filho de Deus; aqueles que acreditamos que no mistério da Incarnação nos foi revelada a verdadeira imagem de Deus, que nunca mais permanecerá escondido; aqueles que ainda nos atrevemos a ficar emocionados ao dar um beijo ao Menino, como se fossemos pastores; aqueles que nos colocamos sob a proteção de Maria, a Mãe de Deus, no início de cada ano; aqueles que ainda sonhamos com os Magos do Oriente e acreditamos na luz que pode guiar e iluminar a nossa vida; todos nós, de raças e línguas diferentes, de expressões e costumes diversificados, de abraços e linguagens multiformes, todos nós, continuamos a ter motivos para celebrar o Natal.
A luz da fé desafia-nos a uma nova atitude diante das sombras e nevoeiros do nosso mundo. Natal é sinal de vida e motivo de compromisso. Celebrar o Natal é olhar para a realidade com os olhos de Deus. Ao contemplar o presépio onde Deus nasce, vemos os «presépios» da injustiça e da violência, do ódio e da guerra… onde tantos homens e mulheres estão mergulhados. Ao contemplar o presépio, vemos famílias desalojadas, expulsas das suas casas, sem pão nem mesa, sem sítio para viver com dignidade. «Tomemos consciência que o mundo pode e deve mudar. Se abrirmos bem os olhos, conseguiremos ver que os pés descalços são muitos e variados. Por isso, o melhor presente que podemos oferecer é ajudar a calçar os pés descalços com a nossa misericórdia e acreditar nas nossas capacidades. Não percamos tempo! Temos diante de nós a oportunidade de devolver a alegria» (Mensagem do Arcebispo de Braga, Dom Jorge Ortiga).

Laboratório da Fé celebrada

Não sabemos exatamente onde Maria deu à luz o seu filho. Mas o texto bíblico precisa: «deitou-o numa manjedoura». Este detalhe está carregado de sentido. A manjedoura é o lugar onde os animais se alimentam. Ora, a vida de Jesus Cristo é uma total entrega à humanidade. Ele alimenta os homens e as mulheres com as suas palavras e com a sua vida. Este é o sentido das representações próprias dos séculos quarto e quinto, onde a manjedoura aparece sob a forma de um altar semelhante aos das primeiras basílicas. Contemplemos a manjedoura. Jesus Cristo vai-se oferecer, na sua última ceia, vai dar-se como alimento para todos, oferece toda a sua vida, dá-se totalmente para nos alimentar. Uma bela de viver o Natal é celebrar a Eucaristia. «Tendo em conta a temática do nosso ano pastoral, a liturgia é, por assim dizer, o berço onde Cristo ‘nasce’ em cada celebração, fazendo-se presente, para nos encher dessa vida nova» (Mensagem do Arcebispo). Celebrar o Natal é acolher a chegada de «uma grande luz».

© Laboratório da fé, 2013

Uma grande luz
Postado por Marcelino Paulo Ferreira | 25.12.13 | Sem comentários
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