PREPARAR O DOMINGO TRIGÉSIMO PRIMEIRO
Tomáš Halík escreveu uma obra — «Paciência com Deus. Oportunidade para um encontro» — sobre o episódio de Zaqueu, narrado no evangelho segundo Lucas (19, 1-10), cuja tradução e edição em português foi realizada sob a responsabilidade das edições Paulinas (Prior Velho, 2013). O texto que se segue é retirado das páginas 250 a 252.
A história de Zaqueu é uma história de conversão, de perdão, de penitência e de acolhimento renovado. É uma história de reconciliação e de salvação: «Porque o Filho do Homem veio procurar e salvar o que estava perdido».
O jesuíta indiano Anthony de Mello chamou a atenção para o facto de em parte nenhuma dos Evangelhos Jesus ter pedido aos pecadores que manifestassem remorsos: não há lugar para remorsos no processo de conversão. Esse processo é um acontecimento de profunda alegria. A aflição suscitada pelo pecado sempre se misturou com a alegria e a gratidão pelo dom do perdão e pela sua generosa aceitação. As pessoas só se podem aperceber do seu pecado, se já se encontrarem fora da cela tenebrosa do pecado; elas só podem ver o pecado à luz da misericórdia. Geralmente, os pecadores não vêem o seu pecado, ou não o vêem com verdade; estão enredados na escuridão. Ver os próprios pecados com verdadeira clareza é um privilégio dos santos. Muitas vezes, estes choravam com sinceridade os seus pecados, mas, simultaneamente, sabiam louvar a Deus pela sua misericórdia.
Se eu vejo o meu pecado, não devo deixar que a visão do mesmo me seduza ou deixe consternado, em vez disso, devo voltar-me para a fonte de luz que me permitiu vê-lo e reconhecê-lo. Se estivéssemos sempre a olhar para trás, poderíamos acabar como a mulher de Lot, transformados em «colunas de sal», e não no «sal da terra». Sim, há momentos em que olhamos para as nossas faltas e descobrimos que, nesse preciso momento, não temos nada que oferecer a Deus a não ser um coração despedaçado, como canta o famoso salmo de arrependimento de David. No entanto, nessa história sobre o pecado e o arrependimento de David, com a qual o referido salmo é geralmente associado, lemos que no preciso momento em que os servos esperavam que David mergulhasse na depressão mais profunda, ele parou de chorar e de jejuar, lavou o rosto e sentou-se à mesa para comer, a fim de se fortalecer para a sua nova vida.
De Mello acredita que, em vez de sublinhar o remorso como o principal componente do processo de arrependimento e conversão, os nossos catecismos deveriam pôr em destaque a confiança no poder do perdão de Deus e na disponibilidade para perdoar aos nossos inimigos. A incapacidade de confiar no poder de Deus para fazer algo substancial com o mundo e comigo mesmo é considerado, por esse jesuíta indiano, o único pecado verdadeiramente trágico: «um pecado contra o Espírito Santo».
© Tomáš Halík
© Paulinas Editora, 2013