Eu digo fé. Tu dizes...
O Laboratório da fé convidou algumas pessoas, crentes ou não crentes, para escreverem um texto sobre a fé. O resultado será apresentado, mensalmente, nesta rubrica intitulada: «Eu digo fé. Tu dizes...».
O texto que se segue é da autoria do doutor António Bagão Félix.
O texto que se segue é da autoria do doutor António Bagão Félix.
Porque sem a dúvida a fé não existe.
Ou fingirá que existe, não subsistindo.
É que ter fé não é encontrar, mas buscar.
Não é receber, mas dar.
E na busca e na doação não desfalecer na escuridão.
E na escuridão acreditar que a fé ilumina.
E na noite encontrar o espírito na paz do corpo.
E na luz ver a sincronia do bem, da verdade e da beleza.
Não se tem fé por se pensar possui-la. É-se em fé se, despojados, nos deixarmos possuir.
A fé não é a imposição mas a aceitação de não compreender.
E não compreendendo, sermos senhores de crer ou de não crer.
Em liberdade.
A mais pura expressão de fé é sabermo-nos pequenos. Insignificantes. Como a semente.
E na pequenez não termos pressa ou angústia de o deixarmos de ser.
Porque a fé não tem medida e exige paciência.
E na paciência está a maior prova de fé: o sacrifício da purificação.
E na purificação encontrar o Absoluto e menosprezar o relativo.
Porque a fé só é plena se o abandono for total.
Mas como despojarmo-nos de um qualquer nada que se transforma em tudo?
Como afastar o tudo relativo e buscar o Todo Absoluto?
Como encontrar a riqueza no deserto?
Como dizer não ao sim e sim ao não?
Como valorizar a morte para a vida?
Como alcançar um minuto que seja de quietude sem mácula?
Tem-se fé porque se resiste.
Resiste-se porque Ele ajuda.
Pedimos-Lhe ajuda porque somos fracos.
Somos fracos porque não renunciamos.
Buscamos a fé.
Caímos. Levantamo-nos. Suplicamos. Queremos. Somos.
Por vezes saciados. Por vezes acorrentados. Por vezes afastados.
Na procura do sinal.
Onde já não há tempo, nem razão.
Mas apenas o que existe na não existência.
A essência.
A alma.
A fé é alegre mas não ri.
A fé é exigente mas não suplica.
A fé é poderosa mas não se usa.
A fé é compassiva mas não passiva.
A fé é inquietante mas não alienante.
A fé é o fermento mas não o condimento.
A fé é o sal mas não o açúcar.
A fé é a incerteza da certeza.
A fé é o testemunho da Palavra.
A fé é a continuação da Esperança.
E se a Esperança é a Luz, faço fé na fé.
A Fé não facilita. Dificulta.
Mas não destrói. Constrói.
Na amargura da nossa dor.
No temor do nosso sentimento.
Na obsessão da nossa procura.
E assim o fim se torna o princípio.
E no princípio está o silêncio.
A expressão sublime da fé.
© António Bagão Félix
© Laboratório da fé, 2013
© Laboratório da fé, 2013
Outros textos publicados no Laboratório da fé
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- José Manuel Fernandes — Sinto que devo muito ao cristianismo
- António Moiteiro — A fé dá-nos uma nova visão