NOVEMBRO: MÊS DA ESCATOLOGIA
O mês de novembro, no coração do outono, remete-nos para as coisas últimas da vida, o final dos tempos. Ao mesmo tempo, coincide com o final do Ano Litúrgico (Ano Cristão), cujas propostas incidem nas referências à morte, ao final dos tempos (na Igreja, usa-se o termo «escatologia»), à esperança na ressurreição, à vida eterna. Os primeiros dias do mês de novembro (Todos os Santos e Fiéis Defuntos) dão o mote para uma renovada reflexão sobre estas temáticas. Neste contexto, também associado ao encerramento do Ano da Fé (24 de novembro de 2013), propomos a expressão do «Credo niceno-constantinopolitano»: «Espero a ressurreição dos mortos e a vida do mundo que há de vir». Esta iniciativa tem ainda como ponto de referência a conferência do Padre Doutor José Tolentino Mendonça, às 21h do dia 21 de novembro de 2013, no Auditório Vita, Braga.
Apresentamos, agora, a (primeira parte da) reflexão de Carlo Maria Martini, retirada do livro «Caminhos Laicais» (ed. Paulinas, Lisboa 1995):
Ilumina, Senhor, a nossa mente, aquece-nos o coração,
como inflamaste o coração dos discípulos de Emaús,
para podermos compreender
a glória que nos prometes,
a vida que nos dás
e o mistério escondido que nos fazes conhecer pela fé.
Ilumina, Senhor, a nossa mente, aquece-nos o coração,
como inflamaste o coração dos discípulos de Emaús,
para podermos compreender
a glória que nos prometes,
a vida que nos dás
e o mistério escondido que nos fazes conhecer pela fé.
Maria, nossa mãe,concede-nos compreender o que vives junto do Senhor,
para conseguirmos exprimi-lo na vida, na doença,
na morte, na ressurreição e na glória.
Para isso, dá-nos ó Pai,
a graça do Espírito Santo
que te pedimos por Cristo Nosso Senhor.
Ámen.
Hoje fala-se pouco da morte e do paraíso, mas creio que é muito importante dar espaço nos nossos pensamentos às últimas realidades que nos abrem as portas da verdadeira compreensão do sentido da vida terrena e do desígnio de Deus na história, instigando-nos a agir no quotidiano corajosamente e com entusiasmo.
para conseguirmos exprimi-lo na vida, na doença,
na morte, na ressurreição e na glória.
Para isso, dá-nos ó Pai,
a graça do Espírito Santo
que te pedimos por Cristo Nosso Senhor.
Ámen.
Hoje fala-se pouco da morte e do paraíso, mas creio que é muito importante dar espaço nos nossos pensamentos às últimas realidades que nos abrem as portas da verdadeira compreensão do sentido da vida terrena e do desígnio de Deus na história, instigando-nos a agir no quotidiano corajosamente e com entusiasmo.
Pontos de partida
1. O medo da morte é um facto existencial, terrível e impossível de eliminar; é também garantia de viver, porque mobiliza os instintos de conservação, de resistência, de agressividade vital. Não se pode combater o medo da morte com um ato de raciocínio, porque o medo surge por si mesmo, é invencível.
2. O medo da morte é o símbolo de todos os outros medos perante a depressão física, psíquica, social. A morte é, na verdade, o último de tantos dramas de que o homem é protagonista: doença, velhice, sobretudo quando acompanhada de achaques e solidão, cansaço, esgotamentos nervosos, perda de gosto pelo trabalho, pelos encontros, pela natureza; e depois os abalos sociais, como insucessos, perda da fama, do prestígio, da posição que tínhamos conquistado. São outras tantas formas de antecipação da morte e por isso as vivemos com medo, com horror, desejaríamos que não existissem.
3. Estes medos, embora moralmente neutros (já que o medo é um instinto), são, porém, de facto, causa e sinal de escravidão interior, porque nos bloqueiam. Por exemplo, o medo de perder a fama, a estima, leva-nos a agir diversamente de como deveríamos e gostaríamos; o medo de perder uma vida tranquila, a comodidade, obriga tanta gente a uma vida negativa, negligente, pecaminosa. E o medo da morte pode levar a experiências que são uma espécie de substituto; penso, por exemplo, nos excessos de sensualidade, no alcoolismo, na droga.
Por isso, o autor da Carta aos Hebreus afirma que Jesus se tornou participante da nossa carne e do nosso sangue «para reduzir à impotência, pela sua morte, aquele que tinha o império da morte, o demónio, e assim libertar aqueles que, pelo temor da morte, estavam toda a vida sujeitos à escravidão» (Hebreus 2, 14-15). O diabo escraviza muita gente durante toda a vida jogando com o medo da morte e de toda a espécie de diminuição física, psíquica e social.
É, pois, necessário que o homem (e não só o cristão) chegue, não a eliminar o medo da morte, mas sim a ultrapassar, a vencer o medo de tudo o que pode revestir a imagem da morte. Sem esta superação — que é o nó central da existência e o jogo da verdade — não estaremos verdadeiramente com Jesus.
Pode-se fazer trapaças sob muitos aspetos e, por exemplo, fingir fazer o bem, ser caritativo, interessar-se pelos outros. Mas não se pode fingir a coragem diante da morte. Muitas vezes podemos presumir que somos mortificados, de ser capazes de tantas renúncias; mas se somos atingidos por uma doença grave, dentro de nós rebenta qualquer coisa que não conseguimos dominar, revelando-nos que na realidade não enfrentámos nem vencemos o medo de morrer.
3. Estes medos, embora moralmente neutros (já que o medo é um instinto), são, porém, de facto, causa e sinal de escravidão interior, porque nos bloqueiam. Por exemplo, o medo de perder a fama, a estima, leva-nos a agir diversamente de como deveríamos e gostaríamos; o medo de perder uma vida tranquila, a comodidade, obriga tanta gente a uma vida negativa, negligente, pecaminosa. E o medo da morte pode levar a experiências que são uma espécie de substituto; penso, por exemplo, nos excessos de sensualidade, no alcoolismo, na droga.
Por isso, o autor da Carta aos Hebreus afirma que Jesus se tornou participante da nossa carne e do nosso sangue «para reduzir à impotência, pela sua morte, aquele que tinha o império da morte, o demónio, e assim libertar aqueles que, pelo temor da morte, estavam toda a vida sujeitos à escravidão» (Hebreus 2, 14-15). O diabo escraviza muita gente durante toda a vida jogando com o medo da morte e de toda a espécie de diminuição física, psíquica e social.
É, pois, necessário que o homem (e não só o cristão) chegue, não a eliminar o medo da morte, mas sim a ultrapassar, a vencer o medo de tudo o que pode revestir a imagem da morte. Sem esta superação — que é o nó central da existência e o jogo da verdade — não estaremos verdadeiramente com Jesus.
Pode-se fazer trapaças sob muitos aspetos e, por exemplo, fingir fazer o bem, ser caritativo, interessar-se pelos outros. Mas não se pode fingir a coragem diante da morte. Muitas vezes podemos presumir que somos mortificados, de ser capazes de tantas renúncias; mas se somos atingidos por uma doença grave, dentro de nós rebenta qualquer coisa que não conseguimos dominar, revelando-nos que na realidade não enfrentámos nem vencemos o medo de morrer.