VIVER O DOMINGO: ao ritmo da liturgia


Trigésima segunda semana


O amor é a presença de Deus

Um deus que nos oprime e que nos impede de crescer e de nos desenvolvermos (a mãe de todas as contradições!); um deus que se reduz ao que aprendemos para a primeira comunhão ou para o crisma; uma deus à imagem e semelhança dos deuses pagãos (às vezes Zeus, outras vezes Apolo, muitas vezes Vulcano, ou até Neptuno...); um deus do mais além deprimente, ligado a enterros, sepulturas, responsos e condenações; um deus «espiritualoide» que não quer saber nada da matéria que supostamente criou; um deus unicamente masculino; um deus que garante os direitos dos mais privilegiados; um deus dos fanáticos, em cujo nome se promovem ações de vandalismo, matanças, burlas, insultos...; um deus infantil, que está sempre à espera da nossa queda para nos arrear de porrada; um deus tapa-buracos; um deus clerical; um deus que se contenta com sacrifícios, que se pode comprar com esmolas, orações, jejuns ou bom comportamento; um deus europeu e ocidental... esse deus morreu! E ainda bem.
Porque Deus — o Deus de Jesus Cristo, o nosso Deus — é um Deus de vivos (e não de mortos).
Mas parece que há muitos que ainda não entenderam nada!
O Evangelho continua a gritar que a transcendência não se realiza para cima, mas para dentro. Que o amor é o sacramento da presença de Deus. Que tornamos Deus presente quando perdoamos. Que não há nada mais «religioso» do que a «justiça»: com os órfãos, com as viúvas, com os desempregados, com os imigrantes, com os «diferentes»... Que ninguém nos vai condenar pelas orações que deixamos de dizer, mas pelas ações que deixamos de fazer. Deus não está no «mais além»: nem para além das nuvens, nem para além da morte. Deus está aqui, em mim, em cada ser humano. Porque o nosso Deus não é um Deus de mortos (nem de coisas mortas), mas um Deus de vivos (de gente viva).
Então o que é que acontece na morte?! A nossa fé diz-nos que Deus não nos tira a vida, mas dá-nos ainda mais Vida: Vida com letra maiúscula. Ele faz de nós, definitivamente, seus filhos (DOMINGO: «Porque nasceram da ressurreição, são filhos de Deus»), isto é, participantes da sua própria vida, para sempre.
É verdade que nós choramos os nossos entes queridos porque, ao morrer, em certa medida os «perdemos» (SEGUNDA: «É inevitável»). Mas a morte, para o cristão, não anula o sentido da vida; pelo contrário, permite reconhecer a fragilidade da nossa condição humana (TERÇA: «Somos inúteis servos») e, ao mesmo tempo, deixar-se iluminar pela fé (QUARTA: «A tua fé te salvou») naquele que nos criou e nos chamou à vida.
Esta visão da vida não tem nada de alienante, mas tudo ao contrário. Deus faz-se presente nas nossas vidas (QUINTA: «Está no meio de vós»), aqui e agora, e dá-nos a possibilidade de viver segundo o seu plano amoroso. Significa que, com a minha vida, começo já a partilhar esse amor com os outros (SEXTA: «Quem procurar salvar a vida há-de perdê-la e quem a perder há-de salvá-la»), com cada homem e cada mulher, que considero meus irmãos; dessa forma é antecipação da Vida, com maiúsculas, onde o amor será a única porta de entrada possível.
Por isso, a vida eterna não começa depois da morte. Começa agora! Deixando-nos conduzir pelo Espírito de Deus (SÁBADO: «sem desanimar»), vivemos já como filhos de Deus, vivemos já a vida eterna.

Até que ponto a fé na ressurreição me faz viver com mais confiança? Esta semana, somos convidados a tomar consciência de que o Deus em quem acreditamos, por Jesus Cristo, é o Deus da vida, que se revela nos acontecimentos quotidianos; nesses acontecimentos que, muitas vezes, desprezamos, porque não parecem revelar-nos o rosto de Deus.

A elaboração deste texto foi inspirada na obra de José Luis Cortés, El ciclo C, Herder Editorial,  nos textos publicados neste «Laboratório da fé» a propósito do trigésimo segundo domingo.

© Laboratório da fé, 2013

Trigésima segunda semana, no Laboratório da fé, 2013
Postado por Marcelino Paulo Ferreira | 10.11.13 | Sem comentários
0 comentários:
Enviar um comentário

Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...
  • Recentes
  • Arquivo