— A Pastoral da Saúde no laboratório da fé —

Depois da minha experiência com doentes mentais com stress pós-traumático de Guerra percebi que, por muitas estratégias utilizadas, medicamentosas entre outras, a única réstia de esperança que em alguns permanecia designava-se por fé. Era esse o único sentimento que muitos traziam inabalável de uma vida de tormentos depois de uma Guerra sem nome, sem rosto, sem intenção, onde não perderam a vida mas perderam grande parte da sua vida porque deixaram no “mato” das ex-colónias a sua identidade. “Valha-nos Deus”: esta era a expressão que alguns dos Veteranos da Guerra Colonial utilizavam quando se lamentavam da vida que tiveram, das tormentas por que passaram e por que fizeram passar muitos dos seus familiares. Na maior parte das vezes terminam os seus dias sozinhos, abandonados por quem já os amou mas que não os consegue ter por perto. O fantasma do stress pós-traumático não os deixa viver em paz. O sofrimento destes homens e de suas famílias pode tornar-se de tal forma que, enquanto procurava perceber as suas impressionantes histórias de vida no sentido de lhes auxiliar o auto-conhecimento muitas vezes perdido, questionava-os sobre a sua fé. Uma grande maioria afirmava a fé acima de qualquer “complicação” terrena e dizia mesmo que Deus nada tem a ver com isto (isto da Guerra que tanto mal lhes trouxe). A culpa afinal é dos Homens, concluíam por si mesmos, porque a inabalável fé destes seres humanos que tanto sofrem permanece intacta. Exemplo disto mesmo é a peregrinação anual à Nossa Senhora do Sameiro. A maioria dos Veteranos de Guerra partilham da fé cristã. Esta revelação é evidente quando, e depois do que é sabido por mim dos atendimentos, verifico a enorme devoção com que oram a Nossa Senhora do Sameiro que consideram sua padroeira, que dizem tê-los protegido na Guerra do maior dos males, a morte. A homeostasia do indivíduo ou o equilíbrio natural para o qual caminha todo o ser biológico é uma meta incrivelmente difícil de atingir para estes homens e suas famílias, mas conseguem ultrapassar uma boa parte da adversidade porque, acima de tudo, estão cheios de fé.

Ana Gomes


Postado por Marcelino Paulo Ferreira | 1.2.13 | Sem comentários
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